Para vermos o azul, olhamos para o céu. A terra é azul para quem a olha do céu. Azul será uma cor em si, ou uma questão de distância? Ou uma questão de grande nostalgia? O inalcalçável é sempre azul.
(Clarice Lispector, da crônica Cosmonauta na terra)
Mas tu, na tua vaga essência, não és nada. Não tens realidade, nem mesmo uma realidade só tua. Propriamente, não te vejo, nem mesmo te sinto. És como que um sentimento que fosse o seu próprio objeto e pertencesse todo ao íntimo de si-próprio. És sempre a paisagem que eu estive quase para (poder) ver, a orla da veste que por pouco eu não pude ver, perdido num eterno Agora para além da curva do caminho. O teu perfil é não seres nada, e o contorno do teu corpo irreal desata em pérolas separadas o colar da idéia de contorno. Já passaste, e já foste e já te amei — o sentir-te presente é sentir isto.
(Bernardo Soares, Livro do Desassossego)